domingo, 15 de março de 2009

Sonhar e... Sorrir? Vol. 4

Eu matei uma assassina - Parte 2
- Vem cá, rapaz... Você não costuma ficar com essa cara nem nos dias mais pesados aqui no colégio.
- Ora, Tiago... Que cara?
- Essa.
- Mas eu nasci com ela, homem! Só tenho essa mesmo.
- A-ha-ha. Engraçadão você, heim?
- Você me conhece... - eu disse com um sorriso cínico.
- Então, conta aí. O que aconteceu? Está com cara de quem tomou um susto enorme de ontem pra hoje.
- É mais ou menos isso. Aconteceu uma coisa bem incomum.
- Como o quê?
Pedi pro Tiago me acompanhar até a sala dos professores, aproveitando que estávamos no horário do intervalo entre as aulas. Teríamos uns vinte minutos pra conversar até o começo da aula seguinte.
- Ontem, quando saí daqui, fui seguido até em casa.
- Quem era?
- Uma assassina de aluguel.
- Ah, André! Dá um tempo!
- É sério, cara. Loura, alta, num conversível vermelho... Ela me seguiu até em casa.
- E, vem cá... Como é isso? Como é que ela é uma assassina de aluguel, seguiu você até em casa para te matar, eu suponho, e você está aqui para contar a história?
- Será que é porque ela não me matou?
- Tá, rapaz. Deixe disso e diga logo o que aconteceu.
- Basicamente nós conversamos até o cair da noite. Ela me seguiu daqui até em casa, fomos juntos ao supermercado, voltamos pra minha quadra, conversamos até perto das sete horas e ela foi embora. Disse que voltaria pra me matar hoje.
- Ah... Então pode ser que você não venha amanhã? Essa é boa...
- Não se surpreenda, se eu não vier mesmo.
- Tá certo. Vem cá... Pode me dar uma carona até em casa hoje? Meu carro está na oficina.
- Claro! Vem aqui pra sala dos professores depois da aula. O Lacerda disse que queria conversar comigo hoje depois da aula. Deve ser rápido. E aí a gente vai.
- Conversar o que com o Lacerda?
- Ele disse que era surpresa. Vamos. A gente vai acabar perdendo o horário da aula.
Isso foi perto das dez horas da manhã. O resto da manhã correu bem e, ao meio dia e meia, voltei para a sala dos professores, como combinara com o Tiago. Cheguei lá e, em cinco minutos, fui chamado pelo Lacerda para a sala da diretoria. Conversamos por mais ou menos meia hora e, depois, fui almoçar com o Tiago. Conversamos um bom bocado na hora do almoço, voltamos para o colégio para uma reunião de professores com o diretor e saímos do colégio no mesmo horário de ontem, em torno de quatro horas da tarde.
- Cara... Eu quero ver o que você vai fazer se o seu carrão quebrar.
- Por quê?
- Porque o seu esportivozinho só tem motor! Não tem portamalas, só entram duas pessoas nele...
- É como eu costumo dizer; esse é um carro pra ter, não pra usar.
- Sei, sei...
Saí do estacionamento sem pressa, como de costume. Virei à direita ao sair, peguei a rua e...
- Aí atrás, Tiago.
- O quê?
- A loura do conversível vermelho.
Tiago espiou pelo retrovisor direito e...
- Rapaz... Que mulherão, heim?
- Eu disse.
- E ela vai te matar hoje, é?
- É o que ela disse que tem que fazer.
- Ela não vai.
- Como assim?
- Ela não vai te matar.
- Como assim, Tiago?
- Se ela fosse te matar mesmo, teria feito isso ontem.
- Tá, tá... Sei...
- Aposto o teu ingresso pro forró hoje à noite.
- Ah, é?
- Se você for hoje à noite, eu pago o seu ingresso.
- E se eu aparecer só amanhã de manhã?
Parei o carro em frente ao prédio do Tiago e ele respondeu antes de sair:
- Se aparecer vivo, o seu ingresso pro forró na semana que vem está garantido com open bar, porque eu tenho certeza de que, se você não aparecer hoje e estiver vivo amanhã, é porque ganhou a modelo.
- Corta essa, doidão!
- É sério!
- Tá, tá, Tiago, tá.
- Obrigado pela carona, garotão. Até mais - ele saiu do carro e fechou a porta.
- Com open bar, heim?
Tiago fez um sinal positivo com a mão e eu saí. Ela ainda me seguia de perto. Saí da quadra acelerando fundo; queria testar se essa loura era mesmo capaz de fazer o que disse que faria - ou coisa assim. Saí cidade afora acelerando como se estivesse participando de uma corrida. Ela me acompanhou bem durante uns dois minutos e, depois, sumiu do meu retrovisor sem deixar pistas. Finalmente consegui despistá-la. Embora agora eu pudesse ir para casa sossegado por não estar mais sendo seguido, resolvi passar na padaria para comprar - sou doido por eles - uns doces. Fui sem pressa, comi alguns doces, deixei outros para quando chegasse em casa e resolvi que era hora de voltar para casa, tomar um banho e trocar de roupa. Eu não queria chegar tarde para o forró.
Cheguei ao meu prédio, estacionei o carro, saí, travei as portas, subi, coloquei a chave na fechadura e... Como assim? Eu jurava ter deixado a porta destravada antes de sair de casa. "Já sei... Ela deve ter chegado antes de mim e está preparando uma armadilha. Essa musiquinha tranquila no meu aparelho de som..." Entrei.
- Quer dizer, então, que tem a chave do meu apartamento?
- Pode apostar que não é só a chave - ela disse. Apesar de não a ter visto, notei que ela sorria enquanto falava.
Passei pela sala, para o meu quarto - não é possível que ela escondeu a chave da porta do meu quarto - , peguei uma muda de roupa no armário e fui tomar banho. Tomei banho sem pressa - pra que ter pressa de ir ao encontro de uma assassina de aluguel, não é mesmo? - e resolvi fazer a barba. Vesti-me da metade para baixo e, enquanto fazia a barba, percebi que ela estava cozinhando alguma coisa. O barulho de comida fritando na frigideira, o cheirinho de carne, pão e temperos pela casa... "Que diabos essa menina está aprontando?" O barulho de fritura logo parou e deu lugar a um - o meu?! - violão acompanhando a música que tocava.
- Você é mesmo incrível. Desfila, posa, persegue, mata e ainda cozinha e toca violão? - disse a caminho da sala, enquanto vestia minha camiseta.
- Você também deve fazer essas coisas, exceto desfilar e posar.
- Engraçadinha.
- Não é menosprezo. Você é bonito, mas não é modelo, certo?
- Certo.
- E persegue, mata, cozinha e toca violão. Aliás, além do violão, toca guitarra.
- Viu minhas guitarras, então.
- Vi. E descobri que uma delas tem o meu nome. Gosta dele?
- Adoro - eu disse sorrindo. Decidido a testá-la, falei: - Agora vamos. Combinei de ir dançar forró com uns amigos. Vai ser ótimo tê-la como companhia.
- Por que não ter a minha companhia e só ela, por enquanto? - ela perguntou, sacando a arma e apontando para o meu rosto. Ela estava em pé no meio da sala e eu apenas longe o bastante para que ela não encostasse sua arma em mim estando com os braços esticados.
- Essa pose não me assusta mais, Bela.
- Ah, não? Que tal com o dedo no gatilho?
- Você é uma graça, sabia? - falei abaixando a arma dela e olhando para a mesa da sala. Havia duas taças de vinho cheias pela metade. Olhei para ela de novo tentando fechar a cara. - Você abriu o meu vinho?! Isso é um vinho caro, sabia?
- Eu sabia. Por isso mesmo abri. Achei que era uma ocasião especial.
- Então também não sabe que eu não bebo - eu disse já sorrindo de novo.
- Não bebe?
- Ah, Bela! Como conseguiu chegar até mim sabendo o pouco que sabe?
- Bem... - ela procurou uma resposta por alguns segundos, deixou a pistola em cima da mesa e... - Vou buscar o nosso jantar.
- Preparou um jantar pra dois? Você é um amor!
Ela voltou da cozinha com um prato em cada mão, entregou-me um deles, sentou-se no sofá e começou a comer.
- De quem ganhou o seu brinquedo?
- Qual deles?
- A pistola no portaluvas do seu carro.
- Ah, sim. Meu irmão me deu. Em parte para me parabenizar pela conclusão do curso de tiro e em parte para para me compensar pelo presente que eu dei a ele quando ele entrou para a polícia.
- E que presente foi?
- Uma Heckler & Koch igual á que ele me deu.
- Você gosta de presentes caros, heim? Os seus carros, o presente do seu irmão, o seu vinho, que, por sinal, está uma delícia...
- Eu estou aqui me perguntando: de quantas maneiras diferentes você poderia ter me matado até agora? E, mesmo assim, não me matou. Poderia ter sabotado meus carros, atirado em mim, explodido o meu apartamento comigo dentro com o gás da cozinha, feito alguma arapuca com o meu chuveiro e me matar eletrocutado com ele, envenado esse pão delicioso...
- O efeito de um veneno no pão ainda viria.
- É. Mas ele não vem.
- Ah, não?
- Não. Senão, você não me teria ameaçado com a pistola de novo.
- Você é esperto. É um menino, mas é muito esperto.
- Menino? Eu? Quantos anos acha que eu tenho?
- Eu sei que você tem vinte e cinco.
- E quantos anos você tem? Com essa carinha de anjo, não sei se tem vinte.
- Vinte e três.
- E mata por dinheiro há quanto tempo?
- Olha... Se vai me interrogar... - interrompi-a pegando meu violão e começando uma música. Comecei, parei no meio, desliguei o aparelho de som e continuei a tocar.
- Você não canta? - ela perguntou.
- Canto.
- E por que não solta essa voz?
- Ah... Não sei se você gostaria disso - deixei o violão no sofá e fui para a varanda. - A noite hoje está tão bonita, não é?
- Está - ela já estava ao meu lado, debruçada sobre o parapeito.
- Como entrou pra essa vida de assassina de aluguel?
- É uma... - hesitou. - ... longa história.
- Conte-me. Estou disposto a ouvir. Tenho a noite toda.
Curioso foi notar que ela deixou escapar uma lágrima de cada olho e, rapidamente as enxugou antes de me perguntar com um claro ar de reprovação.
- Por que quer tanto saber?
- Porque não cabe na minha cabeça a ideia de uma garota linda como você largar a carreira promissora de modelo que tinha para fazer um trabalho sujo desses.
- Eu nunca matei ninguém na minha vida! Você é o primeiro desse serviço sujo.
- Então não tem sangue em você. Não desse jeito.
- Não, André - ela abaixou a cabeça e enxugou as lágrimas. - Desculpa. Dé. Ainda não.
- Ah... "Ainda" não? Se eu sou o primeiro, você nem deve ter largado a carreira de modelo ainda.
- Para com isso! - não eram mais só lágrimas, era um verdadeiro choro. Pus sua franja para trás de suas orelhas, tirei suas mãos de seu rosto e, enquanto enxugava suas lágrimas...
- Não faça isso. Você é muito novinha. Não devia fazer esse tipo de coisa. Deixaria-a traumatizada pro resto da vida.
- Não sei - hesitou e mudou de assunto. - Está frio aqui fora.
Abracei-a. Não, enrolei-a nos meus braços. Ela parecia um bebê desamparado. Encostou a cabeça no meu peito, as mãos juntas entre o meu peito e o dela. Suspirou. "Que será que essa menina tem? Por que tenta fazer isso?"
- Vai pra casa, menina.
- Hm-hm - respondeu negativamente.
- Desiste desse serviço, desiste de me matar, vai pra casa e, domingo, você não vai ter mais quem cobre o seu serviço de você.
- Não, André.
- Vai embora, antes que eu faça alguma besteira.
Ela olhou fundo dentro dos meus olhos. Um olhar daqueles que fazem um bruto cair de joelhos.
- Não, André! Já disse que não!
Segurei o seu rosto entre as minhas mãos com vontade e beijei-lhe a boca. Não sei se por pura brincadeira ou porque estivesse apaixonado pela figura da assassina de coração mole. Pensei que ela fosse querer sair de perto de mim, correr para a sala, pegar a pistola e esvaziar o pente na minha testa, mas não. Rendeu-se. E parecia que não queria outra coisa a não ser aquilo. Depois de um longo beijo e de me abraçar, ela perguntou:
- Por que faz isso?
- Porque sim.
- Isso não é resposta, Dé.
- Então é porque você tem o coração mole e eu acho um desperdício você deixar a sua vida tomar esse rumo horrível.
- Você fala que é tão horrível matar alguém... Por que quer matar o chefe da GREVE?
- Eu tenho contas a acertar com ele.
- Sei...
- Mas isso é história pra outro dia. Vai pra casa tratar de coisas menos importantes que o seu "serviço".
Ela foi para a sala, pegou a bolsa em cima do sofá, pegou a pistola, guardou-a dentro da bolsa e virou-se.
- Eu venho amanhã de novo e, juro, você não escapa.
- Se você vier amanhã, você é quem não escapa.
- Escapar de quê, professorzinho?
- Você não vai conseguir fazer isso. Você tem o coração mole. Entrou na minha casa pra me matar e acabou nos meus braços. Ficou aqui em casa até agora, mas não foi pra me matar, eu tenho certeza disso. Se voltar amanhã... - hesitei. - Quanto mais vezes voltar, mais difícil ficará pra você. Acredite.
Ela andou até a porta e eu a acompanhei de perto. Abri a porta para ela, ela passou para o lado de fora e disse:
- Eu volto amanhã. E...
- "Eu te pego, professorzinho."
- É.
- Se voltar amanhã...
- O quê? Já disse isso duas vezes. Se eu voltar amanhã...?
- Vai ser mais difícil que hoje.
Ela chamou o elevador, voltou para me beijar e, ao ouvir o elevador chegando, disse...
- Tchau. Amanhã eu te mato.
- Não. Amanhã EU te mato.
Ela entrou no elevador e, de lá de dentro, antes de deixar a porta fechar, com uma das mãos me mandou um beijo e, com a outra, fez uma arminha disparando contra mim. "Droga... Perdi o horário do forró. Acho que não vou mais." Retribuí o gesto integralmente.

6 comentários:

Aileen Daw disse...

Hummmm... eu acho q as coisas vão esquentar!!! hihi =)
Keep me posted! =)
Bjo Dé!

Anônimo disse...

sem comentarios
kkkkkkkkkkkkkkkkkkkk
vc, sempre uma boa leitura :D
quem nunca quis conhecer uma assassina gata, rs?
abração!

disse...

who knows?
maybe she is the smart one than ...

hhmmm
mistérios intermináveis!

treta disse...

mata ou não mata
não mata ou mata?

heeein? rs

fiquei imaginando que essa loira aí é metáfora. ela é seu próprio eu-lírico, só que vestido de mulher: irresistível.rs. vc não vai se matar, vai?

Rafaela disse...

Cadê o resto? A gente tá esperando... hauhauha

Beeijo!

Isabela Pinheiro disse...

Dezinho querido! Quanto tempo!
Adorei a história, Dezinho. Tem que colocar o resto aí logo pra gente terminar de ler. Eu me identifiquei muito com essa modelo pseudoassassina, sabia disso? Eu tenho o coração molinho, molinho também.
Lindão, some não, viu? Beijinho da Pinha! *=